terça-feira, 28 de janeiro de 2014

"Programados para o consumo"









A principal identidade dos cidadãos há mais de cinquenta anos é a de consumidor. Isso mesmo, não há engano aqui neste início de frase, somos identificados como consumidores, e não como pais, filhos, mães, amigos, etc. E quanto maior o consumo, “melhor” é o cidadão em relação às instituições e, também, aos outros cidadãos. Portanto, podemos dizer que se estabelece uma relação direta entre a capacidade de consumir e a “popularidade/aceitação” do indivíduo na sociedade. Isso todo mundo conhece na prática, não é mesmo?


A partir desta constatação empírica (ou intuitiva) as pessoas passam a tomar decisões a partir do “princípio da otimização”, isto é, buscam o melhor padrão de consumo ao seu alcance: tentam obter as melhores roupas, os melhores carros, fazer a melhor viagem, o melhor curso, etc. Nota-se que, além de tentar maximizar esta satisfação material, as pessoas escolhem também outras pessoas que obtêm sucesso nesta busca desenfreada pelo, digamos, consumo “ótimo”. E é ai que entra a nossa análise: no ponto em que o consumo deixa de ser algo meramente econômico para se tornar um ritual, uma busca pela satisfação psicológica, social, política e até espiritual.


O que algumas pessoas não sabem é que este consumismo foi planejado na década de 1950 por um grande estrategista em varejo: o analista Victor Lebow. Este conselheiro de finanças do então presidente Eisenhower articulou uma solução para reaquecer as economias mundiais e tornar o consumo o estilo de vida das pessoas. Segundo ele “a enorme economia produtiva exige que façamos do consumo um estilo de vida, que tornemos a compra e o uso de bens em rituais, que procuremos a nossa satisfação espiritual a satisfação do nosso ego no consumo. Precisamos que as coisas sejam consumidas, destruídas, substituídas e descartadas a um ritmo cada vez maior [...]”. A partir deste momento histórico o principal objetivo do Estado passou a ser a produção de bens de consumo (ao invés de saúde, educação, justiça, transporte e sustentabilidade, etc.) e a principal finalidade dos cidadãos o consumo desses bens.  


O que é mais curioso é que as pessoas veem este modelo planejado como se fosse algo natural, ou preferem simplesmente não ver nada! Basta parar um pouco e prestar atenção para notar que os bens são criados de maneira estritamente planejada para se tornarem obsoletos no menor período de tempo (constroem se coisas para se tornarem lixo em menos de um ano – é só olhar para o seu computador, seu celular, seu carro, sua TV, etc.) e, também, como se já não bastassem, criasse um mecanismo psicológico para que o indivíduo se desfaça de coisas que ainda são perfeitamente úteis (como é o caso da moda: se as outras pessoas começam a usar um tipo de produto e você ainda não usa, isso vai criar um desejo tão forte que torna-se imediatamente uma necessidade).


Esse modelo de consumo foi aceito de maneira tão entusiástica pelas pessoas que algumas criam condições extremistas e patológicas em relação ao consumo, como o consumo por compulsão, o consumo por ostentação e o consumo pela moda, além de vários outros, é claro. Criaram-se datas próprias de consumo para determinados tipos de bens (pascoa, natal, dia das mães, dia dos namorados, etc.) e as pessoas se empurram em filas para obtê-los; as empresas viraram vendedoras de sonhos e não de produtos (basta olhar os comerciais); e em crises econômicas o governo manda as pessoas às compras; Além, de vários outros tipos de comportamentos deflagrados pelo consumismo.


A minha sugestão neste breve ensaio é que se você comece a observar o seu comportamento de consumo a fim de conter estas discrepâncias sociais/econômicas/políticas causadas por um sistema totalmente arbitrário, frio, calculista e impessoal. Saiba que a maneira mais saudável de consumo é o consumo consciente, isto é, aquele que leva em consideração suas finanças pessoais, suas necessidades e desejos planejados, o meio ambiente e o meio social (principalmente amigos e família) no qual você convive. O resto é tudo indução do meio em que estamos. Em geral, não agrega em nada.



Publicado no Jornal Tribuna do Interior em 08/01/2014.

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