CASTRO,
Antonio Barros de. O plano real e o reposicionamento das empresas. In: VELLOSO.
São Paulo. J. Olympio, 1995, 356 p.
O Objetivo do presente
artigo é discutir, sumariamente, a questão do aumento da produtividade, base da
aposta governamental, seguida de uma breve digressão acerca das estratégias
empresariais, que parecem tomar corpo na atualidade, através de uma opinião formada pela observação direta
e assistemática das reações das empresas frente às radicais mudanças ocorridas
no meio ambiente em que atuam.
No início do Plano Real
as autoridades negavam-se a tomar conta de questões situadas em nível de
setores em empresas singulares, para eles estas não deveriam sofrer interferências
procedentes dos poderes públicos. A mera referência nesta questão soava como
ameaça de retorno a um passado marcado pelo arbítrio e a concessão de favores. No
novo contexto, o amplo acesso a insumos, equipamentos e tecnologias
atualizadas, seria a avenida entreaberta para o aumento da produtividade.
Os
fatos, como é bem sabido, trataram cruelmente os portadores dessas convicções,
a suposta via de duas mãos logo se revelou congestionada do lado das importações
e flagrantemente subutilizada do outro lado. A derrocada teve como símbolo um
regime especial, altamente protecionista, para o setor automotivo. Vê-se, a
partir desse ponto, que o governo passava a interessar-se vivamente pelo
desempenho singular de setores e empresas.
Acompanhado
da correção de rumo que acaba de ser caracterizada há outra percepção do que
seja a tomada de decisões por parte das empresas. Há, em suma, escolhas a serem
feitas, no enfrentamento/exploração do novo contexto, bem como na definição de
novas estratégias não apenas na situação de setores e empresas, mas na própria
conduta empresarial.
Na
década de 1970 há algo que poderia ser chamado de “situação ideal” onde o trinômio
emprego/crescimento/produtividade tem uma conjugação benigna. Na década de
1980, inicialmente a produtividade cresce, mas este resultado se combina com
forte declínio no emprego. Segue-se, na metade da década, virtual estagnação da
produtividade. Finalmente, na década de 1990, o indicador de produtividade
dispara. Na fase Collor se combina com redução do emprego, posteriormente
acontece algo inédito: o crescimento da produção se combina com redução do
emprego, associada a um acelerado crescimento da produtividade. O ano de 1996
trouxe a exacerbação desta tendência: enquanto o emprego industrial retraiu-se
11,2% a produção cresceu 1,5% (o que indica um aumento de produtividade de incríveis
13%).
Na
raiz desta distorção estaria situado o imenso movimento de desverticalização em
curso na indústria brasileira, “dados confirmam que aqueles setores que mais
avançaram no processo de terceirização em geral tendem a coincidir com aqueles
que registraram maiores incrementos de produtividade”. Como é sabido,
verificam-se, em tais casos, bruscos aumentos no coeficiente importado. Trata-se,
em suma, de saltos verificados na terceirização para fora do país (acompanhados
de reduções correspondentes no valor agregado por unidade aqui produzida).
É
um equívoco também a idéia de que o aumento da produtividade tem sido tomado
como um aumento da competitividade. A produtividade que aqui se faz
genericamente referência é a do trabalho e para que um aumento nessa
produtividade se traduza em redução dos custos unitários de produção é preciso
que os salários (em dólares) cresçam menos que a produtividade, o que não é
observado. O grande aumento da produtividade, ocorrida na década de 1990, da
ordem de 50% foi acompanhado de elevação, da mesma ordem em grandeza, dos salários
em dólares.
Essa
elevação dos salários (em dólares) constituiu um importante ingrediente da
redistribuição de renda ocorrida no advento do Real. Porém na medida em que os
aumentos de produtividade continuem a ocorrer, sem que os salários acompanhem,
passa a caracterizar um fenômeno de reconcentração de renda (o que ocorreria de
forma ainda mais evidente caso o governo recorresse a uma desvalorização do
cambial).
Na
segunda metade dos anos 1980 ocorreu um estancamento da produtividade que só
voltou a crescer no Governo Collor. Isso, somado a retração da taxa de investimento)
sugerem que neste longo período o progresso técnico (que avançava com grande
velocidade no exterior) deixou de ser introduzido no Brasil, configurando um
fenômeno de retardamento tecnológico, que entreabre, em princípio, a
possibilidade de uma rápida recuperação nos anos subseqüentes. Esse processo de catch up evidentemente se encontra em curso o que tem contribuído
para a elevação da produtividade. A partir dai, esse ponto tende-se a
esgotar-se, ou, pelo menos, perder força. Nesse comenos, a capacidade de criar
e experimentar novas soluções adquire uma importância decisiva.
Tais
aumentos de produtividade resultam de decisões feitas pelas empresas em
resposta às mudanças com que se defrontam. O que acontecem de maneira conjunta
e consistente entre si. Frente a essas dificuldades, distinguimos aqui as
diferentes linhagens estratégicas, pela escolha mais afluente nelas contidas:
a) a busca pelo rebaixamento dos custos _ caracterizado pela forte dispensa de
trabalhadores (racionalização, redução do espectro de atividades, terceirização,
abandona de linhas de produção, adoção de métodos organizacionais e gerenciais
contemporâneos, etc.); b) mudança, ampliação e/ou relocalização de capacidade _
em relação a abertura comercial (este ingrediente tende a ser reforçado pelo
ingresso de multinacionais até então ausentes no país); e c) redefinições
patrimoniais/empresariais _ desde a busca de sócios, estabelecimento de
parcerias, até a fusão ou transferência de controle.
No
conjunto dessas linhagens estratégicas ainda cabe o aumento da capacidade
inovativa das empresas (nem os esforços em P&D, nem a qualificação de mão-de-obra
foram sumariamente caracterizadas, nelas prevalecem a mera compra de insumos
mais baratos e a aquisição de equipamentos superiores). Estas soluções aqui
retratadas tendem a ser alcançadas antes por ruptura ou descontinuidade, do que
por evolução.
Passa,
em suma, ao primeiro plano, genericamente, o aprendizado, sendo lícito pensar
que dificilmente se poderia continuar a avançar, no referente a ganhos de
produtividade, à velocidade alcançada por ocasião da recuperação do atraso. Neste
sentido, poderíamos estar saindo de uma fase caracterizada por ganhos fáceis de
produtividade, e ingressando num período em que a capacidade de aprender e
inovar se torna particularmente importante.

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