sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Manifestação do Professor Valdair: Gestão Democrática?

Publicado no Jornal Tribuna do Interior em 10/11/2012, p. 2, Tribuna Livre, Campo Mourão, PR.

Valdair da Silva• Mestre em Educação (UEM, 2006), Prof. de Filosofia da SEED, lotado no Col. Estadual e da Faculdade Integrado. Diretor NS da APPSINDICATO em Campo Mourão. 


A Constituição Federal no art. 206, a LDB - 9394/96, art. 3 e 14 determinam os parâmetros para a gestão democrática: a participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e a participação da comunidade nos conselhos escolares ou similares. Sob esses princípios é que o gestor público deve-se firmar para construir as políticas que vão orientar o efetivo trabalho escolar. Ainda na LDB, o Art. 8º define o regime de colaboração para ofertar a educação a todos e todas e a competência da União, dos Estados e Municípios.

Vale afirmar que é o Estado, conforme o Art. 10, inciso III, que têm a prerrogativa de “elaborar e executar políticas e planos educacionais, em consonância com as diretrizes e planos nacionais de educação”. Nesse processo, os princípios da Gestão Democrática devem ser afirmados e não ignorados ou renegados sob pena da prática educativa já iniciar viciada.

O Conselho Estadual de Educação, por meio da Deliberação 05/2005, definiu no Art. 10, §1.º que a proposta pedagógica deverá ser o resultado do processo de participação coletiva da comunidade e dos segmentos que compõem a instituição e no Art. 11, inciso VIII, determina “gestão escolar expressa através de princípios democráticos e de forma colegiada”.

Das afirmações acima deriva uma primeira definição da Gestão Democrática como sendo um processo político-pedagógico para organizar o trabalho escolar que pressupõe a participação ativa da equipe de direção, equipe pedagógica, professores, grêmio estudantil, agentes educacionais I e II, associação de pais, mestres e funcionários e o conselho escolar na identificação dos problemas escolares, nos debates a respeito das medidas a serem adotadas para a superação dos problemas, avaliação contínua dos procedimentos adotados para atingir os objetivos definidos que compreende, em grau máximo a aprendizagem dos estudantes.

Ocorre que há outras instâncias que contribui de forma positiva ou negativa para a consecução do trabalho escolar. Por determinação constitucional o Estado gerencia a política educacional através da Secretaria de Educação ou órgão correlato, responsável pelo ordenamento legal para as práticas educativas, por isso é que se deve cumprir as normas e os regulamentos.

No entanto, como nos adverte Max Weber, o pai da burocracia moderna, obedece-se “não à pessoa em virtude de seu direito próprio, mas à regra estatuída, que estabelece ao mesmo tempo a quem e em que medida se deve obedecer. Também quem ordena obedece, ao emitir uma ordem, a uma regra: à “lei” ou “regulamento” de uma norma formalmente abstrata” (WEBER, 1979, grifo meu). Assim o agente do Estado que elabora e ordena a execução da política educacional não pode agir de forma diferente ao disposto no ordenamento jurídico citado acima.

A definição de Gestão Democrática acima precisa ser ampliada para afirmar que ela só se efetivará se o processo de gestação da política educacional for democrático. Isso porque, conforme (PARO, 2001, p. 22), “dos condicionantes do autoritarismo na escola, os de ordem institucional estão sem dúvida nenhuma, entre aqueles que mais dificultam o estabelecimento de relações democráticas e em consequência, a participação da comunidade na gestão escolar”.

No processo em curso para definir a nova matriz curricular/2013 a SEED/PR age de forma autoritária e antidemocrática. Mas não é só isso, imbuído do espírito do bom cidadão e da honradez o Vice-Governador e Secretário de Educação faltou com a verdade quando afirmou na imprensa oficial que “promovemos amplo processo de discussão com a comunidade escolar e consulta pública com professores e estudantes para começar 2013 com uma proposta de matriz curricular referencial nas escolas estaduais”.

Para que a mentira ganhe um ar de credibilidade, contornos mágicos para adentrar aos singelos e sagrados ouvidos da populaça, vocifera o arauto “nossa proposta procura atender a todas as escolas a partir de uma base de referência comum, que uniformize o conteúdo das disciplinas para os estudantes de todas regiões. Vamos reforçar disciplinas como Matemática e Português, que passarão a ter carga horária maior, e ofertar duas línguas estrangeiras modernas”. Afirma que iniciou a discussão “ano passado e envolveu quase 10 mil pessoas entre professores, pedagogos e estudantes”.


“A mentira tem perna curta”, afirma o ditado popular. Desconhece-se no “chão da escola” qualquer discussão ou iniciativa que a SEED tenha realizado sobre mudança da Matriz Curricular. Foi só no dia 7 de novembro que se tomou conhecimento da posição oficial de que “a caixa de pandora” será aberta brevemente. Segundo o comunicado oficial foram ouvidos quase 10 mil pessoas, mas curiosamente a APPSINDICATO que tem mais de 65 mil filiados e é a representante legal dos trabalhadores em educação no Paraná sequer foi convidada para conhecer a proposta.


Sob ares democráticos o que se verifica é uma prática antidemocrática. Nesse sentido, as chamadas “consultas públicas” aparecem como alternativas para ampliar a democracia e aqui reside o grande engodo. As tecnologias de comunicação e informação são ferramentas que se bem utilizadas contribuem no processo da democracia participativa, mas não substitui o encontro para o debate franco e aberto para tomar as melhores decisões sobre as coisas importantes para a vida humana. No modelo panóptico estudado por Michel Foucault, o interno é sempre objeto de uma  informação e nunca sujeito numa comunicação, tal modelo se constitui em “uma figura de tecnologia política que se pode e se deve” usar para qualquer finalidade. Parece ser o caso dos dados coletados por meio da antidemocrática consulta pública.


O debate em tela é mais um exemplo de como a SEED viola os princípios da Gestão Democrática. Com o processo de avaliação anunciado para o próximo dia 22/11 denominado de SAEP - Sistema de Avaliação da Educação Básica do Paraná não foi diferente. Na mesma direção vem ocorrendo com o PPA - Plano Personalizado de Atendimento que até o presente momento ninguém sabe efetivamente do que se trata. Tem ainda as expectativas de aprendizagem que apareceu como a última novidade e os professores responderam: queremos as diretrizes de volta.


Paro (2001, p. 24), salienta a angustia de diretores/as “quando percebem sua impotência para realizar, na escola, os objetivos de democracia e divulgação do saber [...] Por isso uma real consciência crítica da situação por parte dos diretores deveria fazê-los rebelar-se contra essa migalha de poder, lutando por um efetivo poder para a escola, que seja aí distribuído entre todos os seus agentes e usuários”. Por fim a Gestão Democrática contribui sobremaneira para realização da democracia plena na sociedade.

Referências:

FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Ed. Vozes: Petrópolis, 2004.
COHN, Gabriel (org), WEBER, M. Sociologia. São Paulo: Editora Ática, 1979.
PARO, Vitor Henrique. Gestão democrática na escola pública. São Paulo: Ática,
2001.

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