
No que tange a moeda, Mauss observa apenas a função meio-de-troca (meio-de-pagamento), não vê sua função de padrão geral de valor (medida-de-valor) , isto é, não demonstra a especificidade da moeda capitalista com um "valor que generaliza" de modo não hierárquico, concepção esta criticada por Malinowski (MAUSS, 1974, p. 75). Talvez, seja porque nas sociedades não-capitalistas, os valores só se generalizam de modo hierárquico! (No sentido de Dumont) Isto é, o valor de certos objetos pode não ser dado no sentido de sua generalização quantitativa, como padrão ou medida de troca. Por exemplo, o seu valor pode estar na capacidade regenerativa milagrosa ou, em uma capacidade emblemática para representar todo um clã ou linhagem.
Na realidade o que distingue tais moedas_ a capitalista e as hierárquicas_ é que as últimas são menos alienáveis. (Talvez possamos dizer assim: possuem menos liquidez). No capitalismo a moeda destroi as esferas de trocas, acabando com a possibilidade de uma dessas esferas vir a ser hierarquicamente superior. A divisão fundamental passa a ser entre o que é e o que não é mercadoria, isto é, passível de compra e venda, ser trocado por dinheiro, etc. No mercado a moeda passa a ser uma medida geral. No capitalismo, a própria alienabilidade passa a ser um valor! Todos desejam a moeda por esta ser aquilo que pode, potencialmente, tudo alienar.
Quando Mauss refere-se em seu trabalho às sociedades melanésias, observa que esta não tem a "idéia de venda [...] e contudo fazem operações jurídicas e econômicas que tem idêntica função [...]" (MAUSS, apud SAPIR, 1994, p. 91) Diz-se o mesmo dos índios da costa noroeste da América, que desenvolveram sua rica civilização material e espiritual, como demonstram, por exemplo, suas esculturas, mas não conheciam nem a agricultura e nem a cerâmica.
Algumas noções, no entanto, são melhor evidenciadas que o potlatch melanésio ou que nas instituições mais evoluídas ou mais decompostas da Polinésia: é a noção de crédito, de termo e, também, a de honra.
"As dádivas circulam, como nós vimos, na Melanésia e na Polinésia, com a certeza que serão distribuídas, tendo como "garantia" a virtude da coisa dada que é, ela própria, essa "garantia". Mas, em toda sociedade possível, a da natureza da dádiva obrigar a termo. Por definição, uma refeição comum, uma distribuição em kava, um talismã que se leva não pode ser retribuído imediatamente. O "tempo" é necessário para executar qualquer contraprestação. A noção de termo está, portanto, logicamente implicada quando se trata de retribuir visitas, contrair casamentos, alianças, estabelecer paz, participar de jogos e combates regulamentados, celebrar festas alternativas, retribuir serviços rituais e de honra, "manifestar respeitos" recíprocos, coisas que se trocam juntamente com coisas cada vez mais numerosas e preciosas, à medida que essas sociedades são mais ricas. (MAUSS, 2003, p. 236-237)
JUROS
O fato das trocas do tipo Potlatch obedecerem a um "crescendo" foi entendido como uma manifestação daquilo que concebemos como empréstimos à juros: deve-se sempre dar mais do que recebeu. Mauss sugere substituir os termos dívidas, pagamento, reembolso e empréstimo, mas mantém o de juros_ chega a falar em "taxas" (apud SAPIR, 1994, p. 112). "Normalmente, o potlatch deve ser sempre retribuído com juros, aliás toda dádiva deve ser retribuída dessa forma. As taxas são em geral de 30% a 100% ao ano." (MAUSS, 2003, p. 249)
Leandro Moreira é economista e aluno do Curso de Direito da Faculdade Integrado de Campo Mourão - PR, período 2015.2
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