domingo, 30 de dezembro de 2012

RESENHA DO ARTIGO: A ESPECIALIZAÇÃO REGRESSIVA: UM BALANÇO DO DESEMPENHO INDUSTRIAL PÓS-ESTABILIZAÇÃO

   

Coutinho, L. A especialização regressiva: um balanço do desempenho industrial pós-estabilização. In Velloso, J.P.R. (org.), “Brasil: Desafios de um País em Transformação”, Editora José Olympio, 1997.





                        O Objetivo do presente artigo é demonstrar que a política econômica pós-Plano Real moldou uma armadilha difícil de desarmar com a sobrevalorização da taxa de câmbio combinada com a sustentação de juros muito elevados. O que, minou, até então, a possibilidade de um crescimento sustentado da economia, que permitiria expeditar a recuperação do terreno perdido durante os longos anos da crise.

                        Ao longo das décadas de 1950-60 a integração da economia mundial foi impulsionada pela transnacionalização das grandes empresas norte-americanas, num contexto de estabilidade do dólar e de hegemonia dos EUA. As grandes empresas européias reagiram e iniciaram movimentos contra-ofensivos de transnacionalização nos últimos anos da década de 1950. O Brasil se beneficiou dessa rivalidade para atrair e negociar a entrada de investimentos estrangeiros em condições favoráveis durante o ciclo expansivo 1950-60, sob o Governo Kubitschek (automobilístico, mecânica, material elétrico) o que contribui decisivamente para modificar o perfil da indústria brasileira e para concretizar um salto no processo de industrialização, viabilizado pelos investimentos públicos e estatais em infra-estrutura e em indústrias de base.

                        No fim dos anos 1960-70, a crise do dólar provocada pela emergência de grandes déficits externo norte-americanos foi acompanhada de crescente desregulamentação financeira, o que ensejou a notável expansão do “euromercado”. Este mercado livre de crédito internacional (alimentado pela maciça oferta de petrodólares após 1973), caracterizou uma nova fase de integração da economia mundial. O Brasil conectou-se a este novo mercado de crédito, através da contratação de empréstimos em grande escala, para sustentar o último ciclo de substituição de importações, sob o Governo Geisel. (Política esta duramente atingida pela alta da taxa de juros flutuantes após 1979 e pela significativa deterioração da relação de trocas entre 1980-83).

Nos anos 1980 a reestruturação tecnológica, organizacional e gerencial derivada da Terceira Revolução Industrial reorientou os fluxos de investimento direto, o comércio internacional e o movimento de capitais intra e entre as economias centrais industrializadas. Desse modo, com exceção da China e de um punhado de economias em desenvolvimento do Leste Asiático, a dinâmica mundial foi inóspita para os países em desenvolvimento, particularmente para a América Latina (AL).  As razões são conhecidas: i) a crise da dívida; ii) a grave desorganização das finanças públicas; iii) a perda de dinamismo da economia brasileira nos anos 1980; e iv) a intensificação das fricções comerciais interblocos (especialmente entre EUA e Japão).

No início da década de 1990 ocorreu uma notável reviravolta. As tentativas de recuperar o crescimento e a marcante fragilidade dos sistemas bancários no mundo desenvolvido induziram os bancos centrais sob a liderança do FED a reduzir sucessivamente as taxas de juros, criando uma busca generalizada por aplicações alternativas. Taxas de retorno mais atraentes permitiu aos mercados emergentes atrair capitais financeiros em escala crescente no triênio 1991-93.

Os países em desenvolvimento foram inundados por capitais externos, no início de 1990, o que permitiu congelar ou estabilizar as taxas nominais de câmbio. O que, por sua vez, deteriorou a balança comercial com crescentes déficits em conta corrente e concomitantemente o retrocesso de parcela não desprezível da indústria doméstica.

No início de 1994 o crescimento acelerado da economia americana e o aparente receio de tensões inflacionárias levaram o FED a subir sucessivamente a taxa real de juros (zero para 3% a.a.). O fluxo de capitais para os mercados emergentes desacelerou-se já no primeiro semestre e passou a pressionar as reservar dos países com elevado déficit em conta corrente. (Sendo ainda recente, o programa brasileira ainda não tinha acumulado déficits continuados em conta corrente e o nível de reserva era bastante elevado). Isso amorteceu a violência da crise (Mexicana), dessa maneira o Brasil conseguiu administrar sem desistir da âncora cambial, mas foi forçado a subir brutalmente as taxas de juros e elevar fortemente as tarifas aduaneiras para alguns setores mais deficitários, e em abril/1995, através de um arrocho monetário/creditício provocou uma incisiva recessão para reduzir o déficit comercial e atenuar as necessidades de financiamento externo.

Essas decisões vêm tendo um preço elevado e não facilmente reversível: as importações saltaram de US$ 30 bilhões em 1994 para US$ 65 bilhões/ano no primeiro trimestre de 1997, ultrapassando em muito as exportações; os juros reais elevados penalizam as decisões de investimento fragilizando a sustentabilidade de expansão. Se considerarmos o PIB da indústria de transformação o coeficiente de penetração das importações (CPI) teria alcançado a significativa cifra de 30,5% em 1996.

É, portanto, inegável o forte viés antiprodução no país (e pró-importação) da política econômica decorrente do programa de estabilização. E este erro de calibragem vem custando muito caro: i) a desindustrialização dos setores e segmentos mais atingidos; e ii) rápida desnacionalização da indústria; Algumas exceções são os setores produtores de commodities, de grande escala de produção, onde a competitividade brasileira é muito forte. E os setores automobilísticos e têxteis sintéticos, por forças especiais de proteção.

É relevante assinalar a clara correlação existe entre o baixo dinamismo de muitos setores industriais e marcante penetração de produtos importados. Beneficiaram-se os lobbies mais bem estruturados, com maior capacidade de articulação política, capazes de extrair do Estado a adoção de medidas excepcionais: em vez de viabilizar uma política isonômica de incentivo sistêmico à busca de competitividade, a distorção câmbio sobrevalorizados-juros altos tende a agravar a heterogeneidade de oportunidade de desenvolvimento. Este excesso de seletividade darwiniana termina sendo contraproducente na medida em que inviabiliza o futuro de setores com potencial.

Fazendo um rápido balanço dos efeitos desse processo podemos observar que a tendência a desindustrialização avança em três dimensões: i) redução do valor-agregado no país em todas as cadeias industriais complexas; ii) perda de espaços da oferta doméstica de bens finais pela ocupação de parte do mercado por produtos importados; e iii) em alguns casos, a produção foi simplesmente suprimida e substituída por importações.

Todas as evidências indicam que esse tipo de abertura da economia brasileira com forte desproteção cambial tornou-se contraproducente, induzindo uma tendência a desindustrialização e à redução de valor agregado das atividades manufatureiras.

Em vários setores as empresas líderes assumiram a dianteira do processo de importação-substitutiva da produção local, efetuou-se um movimento de substituição de matérias-primas, insumos, partes e componentes domésticos por importados. Este recursos deprimem ou pelo menos não amplia proporcionalmente o volume das inversões no país, no sucesso da estabilização que representou uma significativa ampliação da escala do consumo nacional, tanto de bens duráveis quanto de bens não-duráveis.

Verifica-se, de saída, uma expressiva concentração dos projetos de investimento nos complexos produtores de insumos e commodities de grande escala produtiva (metalurgia básica, química básica, agrobusiness, papel e celulose) Em seguida se destacam o complexo automotriz e o têxtil, incentivado por um regime especial de proteção. Finalmente aparecem os investimentos programados no setor de equipamentos e aparelhos de comunicação. É importante assinalar que o estágio de amadurecimento dos processos de investimento é bastante heterogêneo.

No que tange aos investimentos estrangeiros diretos, também verifica-se grande concentração nos setores de bens de consumo duráveis (automobilístico, eletrônico de consumo e de eletrodomésticos) e não-duráveis (alimentos, bebidas e produtos de higiene e limpeza). Concentraram-se nestes setores 78% dos projetos analisados. Sendo a grande maioria dos projetos motivada pela forte expansão do mercado interno, sendo pouco expressivo o componente exportador destes. No caso dos veículos, da química, alimentos, embalagens e latas de alumínio e produtos de higiene e limpeza, onde há efetiva divisão do trabalho e integração logística no plano regional é visível a integração da capacidade produtiva no âmbito regional (MERCOSUL). Esse interesse das empresas já instaladas e dos novos concorrentes atraídos pelo tamanho do mercado vem promovendo ganhos importantes de competitividade, porém não se deve esperar que os investimentos em curso tenham impacto significativo na expansão da renda e do emprego. Além disso, um dos maiores problemas, é que esta “expansão” apenas reitera a “velha” especialização competitiva da economia brasileira em produtos de baixo dinamismo no comércio internacional.

Em resumo, as seguintes características do novo ciclo de investimentos podem ser sublinhadas: i) o aumento das inversões foi relativamente modesto; ii) os investimentos se concentram nos setores produtores de commodities e bens intermediários, que correspondem ao padrão de competitividade brasileira estruturado na década de 1970; iii) a expansão da capacidade instalada desses setores vem sendo retardada e/ou subdimensionada em função da compressão das respectivas margens de lucro resultante da sobrevalorização cambial e do desempenho medíocre dos preços internacionais; iv) as inversões também tem se concentrado nos setores de bens-duráveis especialmente naqueles protegidos e beneficiados por programas especiais de fomento; v) nos bens não-duráveis há crescimento particularmente naqueles menos afetados pela penetração de produtos importados; vi) o mercado interno em expansão tem sido alvo primordial dos investimentos; vii) em muitos setores de produtos intermediários e principalmente no setor de bens de capital, predominam decisões de investimento _ fechamento de plantas industriais, total ou parcialmente e substituição de várias linhas de produtos por importações; e viii) os investimentos em infra-estrutura ainda não se recuperaram expressivamente (exceto a telefonia).

Em resumo, o novo ciclo de investimentos não vem alavancando a capacidade futura de exportação de forma significativa, pois se concentra na “velha” especialização competitiva dos commodities de baixo valor agregado.

Concluindo, a longa crise de uma década e meia não permitiu que o Brasil pudesse acompanhada adequadamente a terceira revolução tecnológica e o processo de aprofundamento da integração econômica mundial; os condicionantes observados de  ordem conjuntural tendem a agravar as fragilidades estruturais e causar crescente retrocesso industrial em muitos setores, na medida que não permitem a formação de um horizonte de desenvolvimento sustentado. No entanto, as condições frente à globalização não constituem uma fatalidade imutável. O Brasil possui energias e potencialidades para optar por outra rota, deve-se articular os instrumentos de fomento industrial e conter, velozmente, a penetração das importações predatórias de forma mais consistente. Tudo isso exige, porém, a compreensão de que a globalização não é um fenômeno espontaneamente benigno para os países em desenvolvimento da periferia. Ela certamente cria possibilidades, mas apenas para as sociedades que tem coesão, estratégia e Estado eficiente para delas tirar proveito.

           
Leandro Moreira da Luz é aluno da disciplina Economia Brasileira no Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Maringá – período 2/2011.




           

RESENHA DO ARTIGO: AVALIAÇÃO DO PROCESSO DE REESTRUTURAÇÃO INDUSTRIAL BRASILEIRO.


Mendonça de Barros, José R.; Goldenstein, Lídia: "Avaliação do processo de Reestruturação Industrial Brasileiro", Revista de Economia Política, vol.17, n.2. 1997

                        O Objetivo do presente artigo é demonstrar que talvez pela dificuldade de compreensão do processo, talvez pela falta de informações, a magnitude das transformações pelas quais vem passando a economia brasileira não tem recebido a merecida atenção.
                        Estamos passando, simultaneamente por quatro diferentes processos: globalização, abertura, estabilização e privatização, que interagindo, têm provocado uma verdadeira revolução no funcionamento da economia brasileira. Neste contexto, a estrutura básica do capitalismo brasileiro, baseado no tripé: estatais, empresas nacionais e empresas estrangeiras estão com os dias contados. A globalização, aqui entendida como revolução tecnológica, financeira e comercial impõe a abertura comercial. A privatização tira de cena, ou reduz em muito, o papel das empresas estatais. Enquanto que a abertura da economia, que é a condição sine qua non para a estabilização, impacta de maneira brutal nas industrias aqui instaladas (nacionais ou estrangeiras), acostumadas a terem reservas de mercado, pela primeira vez, estão sendo obrigadas a pensar em redução de custos, aumentos da produtividade e introdução de novas tecnologias.
                        Com a abertura houve um transferência de renda ao consumidor corresponde às tarifas de deixaram de ser pagas ao governo, e à quase renda (sobre-preço) que os empresários obtinham com a reserva de mercado, além disso houve os ganhos de eficiência, inclusive pela escala. Este impacto da transferência provocado pela redução das margens de lucro das empresas e redução dos preços relativos dos bens-salários tem sido subestimado ou até ignorado. Dada a concentração de renda brasileira e a demanda reprimida da população, uma transferência de renda desse porte afeta positivamente as decisões de investimento das empresas, não só as aqui instaladas, mas importantes empresas internacionais que passaram a olhar o mercado brasileiro com outros olhos.
                        A estabilização trouxe, por sua vez, a contribuição para a ampliação do mercado, não só pelo impacto nos extratos mais baixos da renda, mas pelo impacto sobre o crédito. Esta, somada ao sucesso de consolidação do MERCOSUL, criaram um mercado de tal monta que foi capaz de reverter positivamente as decisões de investimento das empresas nacionais e estrangeiras, em diferentes setores da economia. Os investimentos tem vindo tanto para a compra das tradicionais empresas familiares nacionais como para novas plantas e setores.
                        Com relação às empresas nacionais, a globalização impõe certo nível de produtividade, de tecnologia e de escala de produção impossíveis de serem alcançadas por estas, sendo que o interesse das multinacionais em comprar empresas desses setores aqui instaladas é o de conquistar mais rapidamente um mercado em expansão. Obviamente, esta absorção de empresas nacionais leva, em uma segunda etapa, a novos investimentos.
                        No que se refere aos investimentos estrangeiros o processo é menos óbvio e tem dado margem a grandes equívocos. O mercado brasileiro, somado ao MERCOSUL, passou a ter um tamanho que mais que justifica intenções de investimento e as decisões propriamente ditas. No entanto, existe um caminho que passar primeiramente pelas importações. Primeiro as empresas estrangeiras testam o mercado e a aceitação de seus produtos criando uma rede de distribuição e assistência técnica e só em uma segunda etapa iniciam seus investimento. Nessa fase, continuam importando os produtos finais e começam importar algumas máquinas e equipamentos necessários para a instalação da nova indústria no país. É só numa terceira fase que esta indústria reduzirá seu nível de importações e, dependendo do setor, poderá inclusive tornar-se exportadora.
                        Em relação aos investimentos das indústrias nacionais, as dificuldades de se avaliar o processo não são menores. Além da falta de informação, existe a visão bastante negativa de que os setores e segmentos que não tem conseguido acompanhar o atual processo tem transmitido para a sociedade. É fundamental separar os problemas decorrentes de questões conjunturais (elevadas taxas de juros) das dificuldades mais profundas decorrentes da incapacidade de se ajustar a uma economia aberta. Outro fator é o fato que os novos investimentos estarem se dirigindo para outros eixos que não São Paulo, onde tradicionalmente se localizavam os setores mais importantes da indústria brasileira.
                        Não se pode negar que para muitas indústrias o processo tem sido doloroso se não fatal, entretanto não se pode negar que aqui também uma verdadeira revolução vem ocorrendo. A tradicional empresa familiar está morrendo, no entanto, aquelas que perceberam o processo em tempo e mudaram sua mentalidade procuraram parceiros internacionais e/ou fundiram-se com outras nacionais, ampliando seu porte e ganhando competitividade sobreviverão.
                        Desse modo o processo de redução do “custo Brasil”, investimentos em importantes trechos da Rede Ferroviária Federal, através da privatização vem em franco avanço. As principais críticas que vem sendo feitas é que o Plano Real condenaria o Brasil a continuar com baixas taxas de crescimento, porque a âncora cambial, em que este é apoiado incentivaria quedas substanciais de nossas exportações e incentivaria as importações. Consequentemente, qualquer aceleração das taxas de crescimento, por mínima que fosse, resultaria em movimentos das importações que não poderiam ser financiados pelas exportações.
Mais ainda, a necessidade de financiar as importações que estariam estimuladas pela valorização cambial nos obrigaria a manter elevadas taxas de juros como forma de atração do capital estrangeiro, o que contribuiria para a manutenção de baixos patamares de crescimento. Apesar da coerência dos argumentos, esta crítica tem uma falha básica, pois parte do suporto de que tudo o mais na economia está constante.
                        Como todo processo não-linear, o processo de reestruturação porque passa a economia brasileira é de difícil avaliação, principalmente pela heterogeneidade de situações que tem ocorrido entre e intra os diferentes setores da economia.
                        Numa primeira avaliação através de informações secundárias e entrevistas, se traçou o perfil de alguns setores. Sendo que as primeiras conclusões confirmam que o processo de reestruturação está levando a um “círculo virtuoso”, que caso não seja interrompido garantirá seu dinamismo e o retorno a elevadas taxas de crescimento:

i)                    Setor automobilístico _ Montadoras: Investimento bastante atrativo pela ampliação do mercado; Crítica à “proteção” – com ela novos investidores não poderiam “testar o mercado”; Crítica à “proteção” – com ela novos investidores não poderiam “testar o mercado”; Empresas se modernizando, introduzindo “novas plantas” – “Passamos da idade média de design de 12 anos para algo em torno de 7”; Mudança geográfica – não estão mais concentrados na região do ABC Paulista. _Autopeças: Profundo processo de reestruturação – “[...] quem não tiver tecnologia, escala e um parceiro internacional não sobreviverá [..]”;Compras, fusões, associações e joint-ventures; Metal leve foi comprada pela Cofap que já havia sido comprada quase integralmente pelo Bradesco e por uma multinacional, formando uma empresa de grande porte para manter-se competitiva internacionalmente; Escala e marketing internacionais.
ii)                  Eletroeletrônica de Consumo: Ilustra mais cabalmente a abertura e a estabilização na ampliação do mercado e modernização; Redução no custo de produção e, conseqüentemente, no preço; Em 1996 cresceu 33,62% em relação à 1995 e 109,83% sobre os primeiros seis meses de 1994; (linha branca, imagem e som e portáteis).
iii)                Setor Têxtil : Fiação – quatro grandes empresas internacionalizadas _ Parque de máquinas é velho mas está acontecendo a renovação deste _ permitindo reduções de preços e aumentos da produção; Tecelagem – Poucas empresas competitivas internacionalmente e bastantes empresas atrasadas tecnologicamente; Confecção – muito heterogêneo: 80% de pequenas empresas, 15 de médias e apenas 5% de grandes empresas _ com raras exceções o setor é pouco moderno, com baixa produtividade. Calçados – Não há preocupação com modelagem, marketing, qualidade e não há canais de distribuição no exterior. No entanto, há “sinais”  de que a industria calçadista está reagindo.
iv)                Alimentos: Beneficiou-e enormemente com a estabilização; Aumentou 12% nos últimos 2 anos; Os importados representam apenas 3% do mercado; A venda nas feiras cresceu 43% no último ano (1995); Ocorrência de inúmeras fusões e aquisições e vinda de várias empresas estrangeiras: A Fleischmann Royal/Nabisco vem comprando várias empresas e a Danone comprou parte da Triunfo e a Aymoré (empresa de biscoitos). A Nestlé, preocupada com a perda de mercado para o Kinder Ovo (Ferrero Spa), foi obrigada a investir em produto semelhante
v)                  Farmacêuticos: Em 1995 movimentou 28% a mais que em 1994. Para 1996 a projeção é um crescimento de 10%; Segundo Abifarma o Brasil é o quarto maior mercado do mundo; Expectativas de investimentos de US$ 310 milhões, consolidando um pólo farmacêutico em Jacarepaguá.
vi)                Papel e Celulose: Não há ainda um processo de reestruturação profundo e abrupto; Brasil tem grandes vantagens comparativas; Somos o 1° exportador mundial de celulose de eucalipto; No segmento de papel o consumo vem crescendo significativamente.
vii)              Siderúrgico: Foi o primeiro a ser privatizado; (o que vem permitindo sua reestruturação e modernização); Produtividade de uma média de 158 toneladas/homem/ano em 1990 (quanto 70% era estatal) para 283 toneladas em 1995. Algumas usinas já atingiram o nível das mais produtivas do mundo; Setor muito concentrado (mesmo em termos mundiais).
viii)            Informática: Muitas pequenas e médias empresas fecharam, viraram representação comercial ou prestadoras de serviços ou se associaram a grandes internacionais; As empresas estrangeiras que tinham alguma fabricação de computadores de grande porte deixaram de fazê-lo porque mudou a tecnologia ou estão sendo substituídos por redes; A IBM e a Compaq, líderes mundiais em microcomputadores implantaram fábricas no Brasil entre 1994-96; Empresas como Acer-Acbr, Epson, Olivetti e HP já entraram ou estão entrando no Brasil, utilizando-se de empresas nacionais; O consumo de micro’s passou de 600 mil em 1994 para um milhão previstos em 1996.
ix)                Construção Civil: Vários itens com crescimento expressivo: cimento 12% (1995) e 21,5 no primeiro semestre de 1996; No primeiro semestre de 1996: válvulas e torneiras de aço forjado (155%); pisos e revestimentos plásticos (57,4%), esquadrias de metal (38/3%), tubos de PVC (32,6%) etc; Levou a um aumento do emprego e ao crescimento no número de domicílios no país.
x)                  Máquinas e Implementos Agrícolas: Grandes empresas “voltando” para o mercado brasileiro: Agco comprou a Iochpe-Maxion, a John Deere associou-se à SLC e a J.I. a Case deverá retornar ainda em 1996; Grande concentração no setor: no segmento de tratores há cinco produtores no Brasil: Iochpe-Maxion, New Hollland, Agrale, J.I. Case e Valmet; no de colheitadeiras há três: SLC-John Deere, New Holland e Iochpe-Maxion. Nos implementos apenas 20 dominam a produção e apenas algumas tem condição de competição internacional; As perspectivas são boas na medida em que o setor se demonstra mais estável.

Deste modo, conclui-se que a economia está passando por um profundo processo de reestruturação: no setor automobilístico o processo é claro dado pelos novos padrões de atuação das empresas internacionais; nos setores de alimentos e eletroeletrônicos de consumo a velocidade das transformações é surpreendente; alguns setores como o de calçados e têxteis estão sendo obrigados a renovar-se sob pena de deixarem de existir; no caso dos bens de capital e tecnologia de ponta o passo inicial é posicionarmos entre a política desenvolvimentista e a liberal. Desse modo,  as perspectivas em direção a explosão do desemprego são questionáveis, há um processo de  concentração e desnacionalização que é positivo, observa-se a ruptura do tripé capitalista e assistimos agora a um processo de reintegração produtiva que, se persistente e auxiliado por uma política de investimentos, permitirá o adensamento das cadeias produtivas com internacionalização da produção.
“Uma Política de Investimentos e Competitividade não deve ser confundida com a velha política industrial do passado em que a proteção a determinados setores, comprometia a produtividade de toda a economia. Não se pode repetir o erro de dar incentivos para alguns setores à custa da perda de competitividade internacional e da obsolescência tecnológica. Também não é mais possível criar competitividade às custas do Tesouro Nacional, nem reproduzir o velho jogo de “escolha de ganhadores”
Com esta análise em mente, acredita-se que os objetivos a serem alcançados podem ser assim sintetizados:

      Reestruturação dos setores mais afetados;
      Adensamento das cadeias produtivas;
      Aumento do valor adicionado e modernização tecnológica das exportações;
      Redução do custo de produção;
      Criação de linhas e instituições de crédito;
      Criação de linhas especiais de crédito;
      Criação e desenvolvimento de parcerias no risco dos projetos;
      Políticas horizontais gerais;
      Políticas de suporte das exportações;
      Políticas de atração de investimentos e upgrade tecnológico
      Políticas específicas para pequenas e médias empresas;
      Defesa da concorrência no mercado interno;

Leandro Moreira da Luz é aluno da disciplina Economia Brasileira no Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Maringá – período 2/2011.


           

RESENHA DO ARTIGO: DESENVOLVIMENTO E ESTABILIZAÇÃO SOB FINANÇAS GLOBALIZADAS


COUTINHO, Luciano G. & BELLUZZO, Luiz Gonzaga de Mello. Desenvolvimento e estabilização sob finanças globalizadas. Campinas, IE/Unicamp, Economia e Sociedade, n. 7, 1996, p. 129-154.

                        O Objetivo do presente artigo é demonstrar que nem o desenvolvimento nem a estabilização estão automaticamente assegurados pela globalização. Esta, ao contrário, tende a submeter as economias em desenvolvimento a novas armadilhas e constrangimentos macroeconômicos que poderão custar longos anos de sacrifício e estagnação. Empreendeu-se, também, neste artigo uma reflexão sobre o novo paradigma tecnológico e organizacional da indústria, o que exige novas capacitações e maior poder de coordenação por parte do Estado, revestindo as políticas de desenvolvimento de novas e complexas exigência e condições.
                        As teorias do desenvolvimento econômico sempre tomaram por suposto a necessidade de um papel ativo do Estado, tudo se conformava, coerentemente, à ordem internacional estabelecida pelo regime Bretton Woods.
                        Em contraste, nos anos 1990, a hegemonia do pensamento liberal instituiu um novo paradigma, em que o predomínio das relações de mercado minimizaria incisivamente o papel que deveria ser empenhado pelo Estado. Sob a égide da globalização a política de desenvolvimento se reduziria à criação das condições propícias para atrair investidores, lubrificando-se ao máximo a liberdade privada de acumulação. No entanto, como se verá adiante, sem um Estado capaz de preservar minimamente um espaço de autonomia para a sua gestão macroeconômica, à submissão às finanças globalizadas pode ser traiçoeiramente deletéria para o desenvolvimento.
                        É conhecida a influência dos estoques de ativos financeiros (e respectivos mercados) sobre as políticas econômicas e sobre o funcionamento das economias contemporâneas. A novidade é a participação crescente das famílias como ofertantes de fundos e detentoras de papéis, sendo que na outra ponta estão os Tesouros Nacionais, grandes empresas e bancos. A transformação das poupanças em créditos bancários cedeu lugar à finança direta, mobilizada através dos mercados de ativos. Estes que possuem características como: profundidade, liquidez, mobilidade e volatividade. Esta última que, associada às demais características, suscitou  desenvolvimento de instrumentos de hedge, chamados derivativos, que buscam neutralizar os riscos de perda de rendimento e/ou de capital.
                        É ingenuidade supor que este mercado atende aos requisitos de eficiência, no sentido de não haver estratégias “ganhadoras” acima da média, derivadas das assimetrias de informação e de Poder. E é um truísmo afirmar que estes mercados são intrinsecamente especulativos. O problema é que nestes mercados dominados pela “lógica dos estoques” a especulação não é estabilizadora nem autocorretiva, porquanto a coexistência entre incerteza, assimetria e mimetismo frequentemente dá origem a processos auto-referenciais, instáveis e desgarrados dos “fundamentos”.
                        Desde a afirmação de sua supremacia, em meados dos anos 1980, os mercados financeiros foram palco de uma sucessão de episódios críticos. Entre eles o crash das bolsas de valores de 1987, o crash dos mercados imobiliários em 1989, o colapso da Bolsa de Tóquio em janeiro de 1990, os ataques especulativos às moedas fracas do SME em 1992 e 1993, a crise no mercado americano de bônus em meados de 1994, a crise mexicana de dezembro do mesmo ano, a forte desvalorização do dólar em abril/junho de 1995 e a instabilidade da Bolsa nova-iorquina em 1996. Em suma, mais do que em qualquer outro período da histórica econômica, as políticas monetárias estão severamente constrangidas pelas tensões e desequilíbrios que nascem dos mercados financeiros.
                        As autoridades monetárias passaram a temer a progressiva severidade e generalização dos efeitos perversos das reversões cíclicas engendradas nos mercados financeiros. Desequilíbrios estes que permanecem encobertos na etapa altista do ciclo, neste há valorizações que estimulam o sobreendividamente dos agentes, impulsionando o consumo, o investimento produtivo e a própria valorização fictícia da riqueza financeira.
                        Aos primeiros sinais de aquecimento no nível de atividade e diante da percepção de que os ativos estão sobrevalorizados e as taxas de juros de longo prazo estão baixas (diante da inflação projetada) os agentes mais ágeis atiram primeiro e precipitam um sell off provocando uma espiral baixista dos preços dos títulos e, consequentemente, as taxas de juros longas se elevam abruptamente.
A deflação dos preços nos mercados da riqueza tende sempre a desvelar a existência de situações de fragilidade financeira e, em muitos casos, de patrimônios líquidos negativos ou prestes a se tornarem negativos. Isso significa que são muito poderosas as forças que tendem a empurrar a economia para uma trajetória depressiva e inflacionária.
As políticas monetárias nos países centrais movem-se, portanto, em um corredor estreito entre a obrigação de prevenir as deflações agudas, através de repetidas intervenções de última instância (sempre acompanhadas de risco moral) e a necessidade de regular a estabilidade da economia.
As autoridades preferiram até agora, nesse contexto, apostar em uma “autocorreção” endógena e moderada do ciclo financeiro recente, temendo que uma nova elevação das taxas, ainda que moderada, possa determinar alterações mais drásticas nas expectativas, capazes de produzir não só uma “correção de preços” dos ativos, mais forte do que a desejada, mas também desastres de grandes proporções nos mercados emergentes.
As políticas monetárias ainda sofrem com a coexistência entre mercados financeiros globalizados e um sistema internacional plurimonetário, com taxas flutuantes de câmbio entre as três principais moedas, o que não seria tão problemático se o país detentor da moeda central (aquela em que são denominados a maioria dos contratos e que funciona como meio de pagamento preferencial no conjunto das transações) não fosse devedor líquido e cronicamente deficitário em conta corrente.
Nos anos 1980 houve a destruição dos padrões monetários nacionais na América Latina. A ruptura dos fluxos de financiamento externo, no início da década, desencadeou uma severa crise cambial, que se desdobrou em grave desestruturação fiscal e na progressiva perda da capacidade de gestão monetária. Nesse contexto, o BACEN estava constrangido a garantir liquidez para a massa de riqueza financeira de curtíssimo prazo, sob pena de desencadear uma fuga para os bens e ativos reais, provocando a erupção da hiperinflação aberta. Podemos dizer que esta crise, em boa parte, decorreu das políticas de ajustamento recomendadas pelos organismos multilaterais. A combinação entre tentativas de desvalorização da taxa real de câmbio e austeridade fiscal/monetária revelou-se inconsistente, numa situação que o Estado carregava estoques muito elevados da dívida em moeda estrangeira e só tinha condições de financiar a transferência de recursos para o exterior através da ampliação do endividamento externo de curto-prazo. A partir dai as autoridades começaram a buscar alternativas heterodoxas, tentando desmontar os abrangentes sistemas de indexação: programas que procuraram fixar âncoras nominais, através do congelamento de preços e da taxa de câmbio.
Nos anos 1990, com a fadiga generalizada da alternância entre políticas convencionais e heterodoxas, acontece uma notável reversão dos fluxos de capitais em favor dos mercados emergentes associada a consolidação de uma nova proposta “reformista” por parte dos organismos multilaterais codificada por John Williamson sob a epígrafe do “Consenso de Washington” cujos pontos principais são: austeridade fiscal, abertura comercial, liberalização cambial e financeira, desregulamentação, privatização e redução do papel do Estado.
Embora a reversão do fluxo de capitais tenha sido o fator crucial do sucesso das novas experiências de estabilização, as honrarias foram atribuídas às virtudes das reformas “estruturais” advogadas pelo Consenso, o que suscitou numa reavaliação radical do desenvolvimentismo e das políticas de substituição de importações, que passou a ser a “origem de todos os males”: o fechamento da economia, a má alocação dos recursos, a baixa competitividade da indústria e, last but not least, a desordem fiscal e monetária que conduziu a hiperinflação. É importante salientar que boa parte dos críticos do Consenso de Washington já havia apontado a exaustão do chamado modelo de substituição de importações. O segundo choque do petróleo e o choque dos juros promovido por Paul Volker o final de 1979 decretaram a obsolescência da agenda reformista dos anos 1970. Se uma lição pode ser extraída da chamada “década perdida”, ela tem a ver com as conseqüências funestas de se tornar a economia excessivamente dependente do financiamento externo.
O traço comum dos programas “heterodoxos de segunda geração” foi a utilização do compromisso de manter a taxa de câmbio nominal como âncora do processo de desinflação. Sendo que o fator decisivo para a transformação de doadores de “poupança” para receptores de recursos financeiros foi a deflação da riqueza mobiliária e imobiliária observada já no final de 1989, nos mercados globalizados. Nesse contexto, os países periféricos (até então submetidos às condições de ajustamento impostas pela crise da dívida) foram capturados pela globalização, executando os programas de estabilização de acordo com as normas dos mercados financeiros liberalizados: A regra básica das estabilizações com abertura financeira é a criação de uma oferta de ativos atraentes que possam ser acampados pelo movimento de globalização: títulos da dívida pública, ações de empresas em processo de privatização, bônus e papéis comerciais de empresas e bancos de boa reputação e, posteriormente, ações depreciadas de empresas privadas, especialmente aquelas mais afetadas pela abertura econômica e pela valorização cambial.
Haja vista que, a estabilização conquistada nestas condições coloca-e sob ameaça permanente de ruptura. E, como era de se esperar, a rápida acumulação de reservas provocaram um crescimento acelerado da dívida pública ampliando a fragilidade financeira, a despeito da elevada taxa de crescimento do produto e da receita de impostos entre setembro de 1994 e abril/maio de 1995, resultante do fim do “imposto inflacionário” que incidia sobre a massa de salários e demais rendimentos perfeitamente indexados. O desequilíbrio fiscal tornou-se mais profundo quando o governo (acossado pelo déficit da balança comercial projetado para 1995) tomou severas medidas de restrição ao crédito, provocando uma rápida desaceleração do crescimento do produto e renda. (o resultado não poderia ser outro, senão o surgimento de níveis de inadimplência muito acima da média histórica, atingindo em cheio o sistema bancário, já fragilizada pela perda das receitas inflacionárias).
Além destes problemas, a combinação entre câmbio e juros pode provocar também várias distorções alocativas: disrupção das cadeias produtivas e a distribuição setorial do investimento. Além disso, este modelo de estabilização vem acompanhado de um crescimento bastante rápido do endividamento externo da economia que, ao contrário do endividamento desenvolvimentista, esta nova etapa aumenta em muito a vulnerabilidade da economia a um choque externo.
Os quatro supostos (estabilidade, abertura, privatização, liberação cambial) sugerida pela estratégia do Consenso de Washington prediziam que seriam eliminadas as distorções acumuladas durante o processo de substituição de importações e aumentaria significativamente a “competitividade” das economias emergentes. A desaparição de setores, a redução do valor agregado nas cadeias produtivas e o enxugamento das empresas são considerados benéficos e necessários para tornar mais eficientes os sistemas industriais. Desse modo seriam elevados os ganhos de produtividade, a ponto de compensar com sobras as desvantagens criadas pela valorização da taxa de câmbio. Por outro lado, o investimento estrangeiro desempenharia um papel chave como veículo do progresso tecnológico e organizacional, essa transformação teria uma forte inclinação exportadora.
Essa visão otimista parte de constatações verdadeiras, mas chega a conclusões discutíveis: a flexibilização das importações não é suficiente como fator de atração do investimento externo “inovador”, na ausência de um regime favorável à exportação (era necessário uma abertura comercial gradualista, preservando-se uma taxa de câmbio estimulante às exportações); o governo Collor pecou em desmantelar o sistema de crédito às exportações quando deveria ter aperfeiçoado e por ter antecipado imprudentemente o último estágio do cronograma de redução das tarifas aduaneiras (isso conjuminado com os acordos de Ouro Preto e à posterior apreciação nominal do câmbio criaram um fenômeno prodigioso da abertura com viés antiexportador).
Para justificar as autoridades econômicas têm recorrido a malabarismos teóricos e estatísticos a respeito dos ganhos de produtividade propiciados pela abertura. (há uma identificação simplória entre ganhos de produtividade e competitividade internacional).
Há falhas tanto do mercado quanto da ação governamental. A ideologização do falso dilema Estado versus Mercado omite, de partida, o fato óbvio de que a existência e o bom funcionamento dos mercados requerem “juridificação” (criação de normas e instituições). É bastante reconhecida a necessidade de intervenção em processos que envolvam externalidades positivas e negativas. Evidentemente, estas falhas não sobrevivem nos modelos de equilíbrio geral, nenhum dos teóricos do equilíbrio geral aceitaria deduções de políticas (ou a ausência delas) a partir deste modelo abstrato. Apesar das reiteradas advertências, os liberais mais radicais insistem em extrair ensinamentos normativos destas construções teóricas.
A demonstração da inevitabilidade de uma inserção passiva das economias no chamado processo de globalização é um dos objetivos do pensamento dominante, no entanto, é conveniente relembrar que este processo foi resultado de políticas que buscaram enfrentar a desarticulação de bem sucedido arranjo capitalista do pós-guerra. A inserção dos países neste processo, longe de ter sido homogênea, foi, ao contrário, hierarquizada e assimétrica.
O que é decisivo para a autonomia das políticas nacionais é a forma e o grau de dependência em relação aos mercados financeira sujeitos à instabilidade das expectativas. Além disso, o grau de “inserção internacional” dos países corresponde a padrões muito distintos. Enquanto uns são protagonistas ativos, mantendo taxas de crescimento de suas exportações acima da média mundial, outros ajustam-se passivamente, perdendo participação nos mercados.
“Essa é a lição que nos oferece a decantada globalização: os países que buscaram preservar um espaço para suas políticas macroeconômicas são capazes de sustentar taxas reais de juros baixas, administrar  taxas de câmbio estimulantes, promover o avanço industrial e tecnológico, garantindo assim o robustecimento de seus grupos nacionais privados. A globalização, ao contrário do que predica o paradigma liberal, exigiria maior capacitação e maior poder de coordenação dos estados nacionais para engendrar condições favoráveis à competitividade, ao financiamento e à sustentabilidade dos processos de acumulação de capital com inovação tecnológica.”

Leandro Moreira da Luz é aluno da disciplina Economia Brasileira no Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Maringá – período 2/2011.

           

RESENHA DO ARTIGO: ECONOMIA COMPETITIVA, SOLUÇÃO PARA A VULNERABILIDADE.


BARROS, José Roberto Mendonça de, GOLDENSTEIN, Lídia. “Economia competitiva, solução para a vulnerabilidade”. In: O Brasil e o Mundo no limiar do novo século. Rio de Janeiro, Olympio, 1998.

                        Discutir um conjunto de medidas voltadas para o aumento da competitividade é o objetivo do artigo. De início, este apresenta um histórico sobre as discussões e políticas voltadas para o desenvolvimento econômico é após faz uma análise do cenário atual quando sugere políticas para fomentar as mudanças necessárias para o desenvolvimento.
                        Nos anos 1980 as atenções se voltam para o processo inflacionário que mobilizava todos em esforços em torno de seu combate. Por quase dez anos governos e planos econômicos sucederam-se perseguindo, sem sucesso, o ajuste fiscal. Preservaram-se e sofisticaram-se apenas informações concernentes à inflação, cujos acessos antecipado a certos indicadores traduzia-se em ganhos imediatos e vultuosos. Além disso, o achatamento salarial somado à atratividade exercida pelo mercado financeiro levou a uma significativa “fuga de cérebros” nas universidades. Salvo honrosas exceções, como o Fórum Nacional, os temas ligados ao desenvolvimento passaram a ser considerados menores. Nos anos 1990, com a percepção de que o ajuste fiscal era uma condição necessária, porém insuficiente para a estabilização, a abertura comercial entra em cena, passando a ocupar junto com o déficit público, o centro dos debates e das atenções.
                        No entanto, não só não existiam instrumentos novos para combater a inflação, como não havia sequer reflexão sobre o que fazer após a estabilização, o que havia eram controvérsias entre os defensores do mercado e os defensores dos velhos instrumentos de política econômica. E é nesse ambiente hostil que emerge a percepção da profundidade e da importância do processo de reestruturação pelo qual estava passando a economia. No entanto nos primeiros quatro anos 1994-98 essa visão ainda continuou enevoada.
                        O ponto de partida do Real foi a retirada da inércia inflacionária e a desindexação. O ponto de chegada deve ser o crescimento sustentado. A consolidação da estabilização e a retomada do desenvolvimento dependem dos avanços do processo de reestruturação do regime fiscal que criará condições para a elevação da poupança doméstica e, conseqüentemente, alívio nas contas de capital; e da reestruturação produtiva, para a recuperação da competitividade, e conseqüentemente, alívio de nossas contas comerciais. Uma vez acontecido, ampliarão os espaços pra a queda das taxas de juros acrescidos da queda do risco país, reforçando a possibilidade tanto de consolidação fiscal quanto da elevação das taxas de crescimento. No cenário atual, no curto prazo, é a taxa de juros que mantém a consistência do sistema, atraindo capitais externos e impedindo a elevação das taxas de crescimento.
                        Assumida a necessidade de se aprofundar a reestruturação produtiva, é preciso fazer uma análise dos principais setores da economia, pois não se pode ignorar que se acumulam evidências de que a recuperação da competitividade brasileira avança firmemente. E é fundamental uma ação governamental que ajude tanto a avançar e consolidar o atual processo como a diminuir seus custos. Sem uma reconstituição institucional dificilmente conseguiremos consolidar a estabilização e, muito menos, retomar o desenvolvimento sustentado.
                        Um primeiro conjunto de medidas de política gira em torno da necessidade de equalizar as condições de competição das empresas instaladas no Brasil às condições internacionais. A falta de isonomia hoje existente é um verdadeiro desincentivo à produção local, inviabilizando certos investimentos, nacionais e internacionais. Pode-se destacar, à nível de equalização, algumas medidas como: reforma tributária, diminuição do “Custo Brasil”, “aumento da concorrência”.
                        Depois da abertura muitos analistas têm sido contra qualquer proposta de defesa comercial. Entretanto, o país precisa desses instrumentos sob pena de, caso não os utilize, sofrer conseqüências desleais e predatórias de países não signatários dos mesmos acordos internacionais e/ou países que mesmo signatários sejam extremamente agressivos (ou heterodoxos) em suas práticas comerciais.   
                         Um setor que deve se desenvolver às pressas é o sistema financeiro, pois este está longe de seus congêneres estrangeiros na sua capacidade de financiar a produção e comercialização. Esta transformação é condição sine qua non para a reestruturação produtiva.
                        Um segundo conjunto de medidas está relacionado às exportações. Esta é condição para a consistência macroeconômica na passagem para o crescimento sustentado. E esta, depende dos investimentos. Não só deixamos de exportar certos produtos como passamos a importá-los. O retorno dos investimentos nestes setores não só reduzirá nossa necessidade de importar como elevará nossa capacidade exportadora.
                        Alguns questões são de suma importância no tocante a esse objetivo: i) existe uma visível tendência de aproximação das margens de lucro entre o mercado interno e externo; ii) A disseminação de tecnologias mais modernas e do novo paradigma produtivo tem resultado na melhoria dos produtos, tornando-os muito mais parecidos com os importados; iii) A América Latina, apesar de considerada como um mercado menos nobre por não ter moeda forte, é extremamente importante; iv) Exportação é um fonte barata de financiamento de capital de giro; v) deve criar uma mentalidade exportadora na qual as exportações façam parte do projeto estratégico das empresas; vi) Transformar em instrumentos de fácil acesso as novas políticas que vem sendo implementadas; vii) Atrair mais empresas; viii) Criar novos instrumentos de política econômica consistente com o novo modelo;
                        Um terceiro conjunto de medidas é de âmbito mais amplo e contribuem para o aumento da competitividade sistêmica do país. Neste conjunto cabe a educação, a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico.
                        Um quarto conjunto de medidas visa adequar a institucionalidade vigente às transformações pelas quais o país vem passando. É fundamental a coerência aos diversos órgãos, em diferentes ministérios, com atribuições sobre o assunto. Este é o papel da Camex. Inúmeros são os casos do envelhecimento da institucionalidade vigente que, em muitos casos, tem se revelado um verdadeiro desincentivo ou até mesmo um impedimento a novos investimentos.
                        Um quinto conjunto de medidas engloba as novas políticas que vem sendo criadas para a atração de novos investimentos e/ou viabilização de investimentos. São vários os exemplos destas novas políticas: Setor de telecomunicações, o Cinescópio, etc. É fácil observar que os avanços só ocorreram nos setores em que se realizou um trabalho conjunto com o setor privado.
                        Concluindo, a saída do atual impasse macroeconômico no qual o Brasil se encontra passa pelo aprofundamento da reestruturação produtiva. É ela quem viabilizará o aumento das exportações necessário para uma maior estabilidade no Balanço de Pagamentos.                   

Leandro Moreira da Luz é aluno da disciplina Economia Brasileira no Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Maringá – período 2/2011.

sábado, 29 de dezembro de 2012

RESENHA DO ARTIGO: CRESCIMENTO DOS FLUXOS DE CAPITAL E DESENVOLVIMENTO: UMA VISÃO GERAL DAS QUESTÕES DE POLÍTICA ECONÔMICA.


Devlin, R.; French-Davis, R.; Griffith-Jones, S. Crescimento dos fluxos de capital e desenvolvimento: uma visão geral das questões de política econômica. Pesquisa e Planejamento Econômico. Rio de Janeiro, v. 24, n. 3, p. 411-444, dez. 1994.

                        Este artigo apresenta questões de política econômica relativas aos influxos de capital, baseando-se nos estudos de caso efetuados neste e também em outros trabalhos recentes sobre o assunto. É dividido em quatro seções: introdução, a seção 2 que repassa os fundamentos conceituais do papel dos fluxos de capital externos no desenvolvimento econômico e a questão da liberalização financeira e abertura da conta de capital; a seção 3 focaliza as fontes do recente crescimento acelerado dos fluxos de capital e algumas das implicações de políticas no lado da oferta; e a seção 4 que faz uma avaliação do impacto atual desses fluxos de capital sobre as economias da América Latina e um exame das implicações de políticas.
                        A partir de 1960 observa-se um crescimento substantivo dos mercados internacionais de capitais refletindo um aumento do comércio mundial e a globalização da produção e fatores puramente financeiros que se propagam com uma velocidade maior. A fuga desses capitais foi incentivada pelas desregulamentações financeiras nacionais, à diminuição dos controles de capital e a diminuição dos impostos. Isso, conjuminado com os avanços tecnológicos e nas telecomunicações e, com o surgimento de uma engenharia econômica cada vez mais sofisticada contribuiu para o crescimento acelerado dos fluxos financeiros nacionais e internacionais.
                        Esses desenvolvimentos geraram uma controvérsia: de um lado estão os que vêm a integração crescente como um sinal de maior eficiência e acham que os mercados estão superando a supressão financeira característica da regulamentação ineficiente dos governos; e de outro lado estão os que vêem o crescimento acelerado dos fluxos de capital como especulação de alto risco que ameaça a soberania nacional. E, naturalmente, há entre esses dois extremos várias posições que reconhecem as vantagens potenciais de uma maior mobilidade internacional do capital, mas também estão preocupados com questões como sustentabilidade, competitividade internacional, crescimento e justiça social.
                        Na América Latina essa controvérsia assumiu grande importância, principalmente após os grandes fluxos de capital no período 1991/93 que permitiram contornar a restrição externa que contribuíra para baixo níveis de investimento e grave recessão econômica, entretanto, também tiveram uma influência indesejada sobre a evolução das taxas de câmbio, o grau de controle da oferta monetária, as obrigações externas e, possivelmente, a vulnerabilidade futura a novos choques externos.
                        Entre os principais papéis do capital externo significativos para o desenvolvimento estão a canalização das poupanças externas em direção aos países com capital insuficiente e o financiamento compensatório dos choques externos, que ajuda a estabilizar o dispêndio doméstico.
                        É fato que os capitais melhoraram sua eficiência na alocação ao buscarem melhores taxas de retorno, no entanto, como reflete a teoria pode haver sérias ineficiências originadas desses mecanismos alocativos. No curto prazo, as imperfeições fazem com que os mercados aloquem capital de mais ou de menos e quando os erros são muito grandes podem induzir a crises com conseqüências devastadoras para empresas, setores e nações. Essas perturbações do curto prazo podem gerar vantagens ou desvantagens arbitrárias a diferentes agentes econômicos, podendo por si só tornarem-se determinantes dos retornos e, portanto, das tendências internacionais de alocação de recursos.
                        A mobilização da poupança externa tem o papel clássico dos fluxos de capital em um país em desenvolvimento. Esta somada com algumas condições pode criar um círculo virtuoso no qual há uma expansão econômica sustentada. No entanto, estas podem não ser todas satisfeitas na prática: os problemas antes mencionados e a conseqüente crise de pagamentos fizeram, freqüentemente, com que este mecanismo de desenvolvimento operasse fragilmente.
                        A mobilidade de capital também pode ajudar a distribuir no tempo os custos de diferenças intertemporais entre produção e gasto. Porém, este processo pode nem sempre evoluir suavemente na prática. Nem sempre é fácil determinar um declínio do setor externo é transitório ou não e qual será a sua duração. Essas incertezas, combinadas com as imperfeições dos mercados internacionais de capital (especialmente as assimetrias de informação e os problemas quanto ao cumprimento) representam obstáculos ao ingresso de volumes adequados de financiamento externo.
                        No que se trata ao livre comércio de ativos financeiros e sua analogia entre o livre comércio de mercadorias, esta pode estar equivocada, principalmente porque  este último gera transações completas e instantâneas enquanto o comércio de ativos financeiros é intrinsecamente incompleto e de valor incerto. Por isso, algumas formas de regulamentações do comercio de ativos melhoram os funcionamentos dos mercados, como também o desempenho geral da economia através do aprimoramento da estabilidade macroeconômica e do melhor desempenho a longo prazo do investimento.
                        O consenso de que a mobilidade do capital é um componente necessário ao processo de desenvolvimento não analisa o capital-como-um-todo, não observa algumas variáveis importantes do mundo real: gargalos no acesso às informações, peculiaridades institucionais dos investidores, estrutura de mercado onde os investidores operam, o volume e o momento do financiamento e os custos e volatividade. Como a prática real pode condicionar os méritos até mesmo dos argumentos teóricos mais atraentes não é de surpreender o debate em torno dos mercados financeiros internacinais e sobre a mobilidade do capital. Nos últimos anos o número de proponentes de contas de capital aberto tem crescido constantemente, mas recentemente parece haver uma tendência crescente no sentido de um pensamento mais pragmático com relação a essa abertura. De todo modo, faz-se seguir uma revisão das tendências.
                        De 1950 a 60 o pensamento principal sobre desenvolvimento focalizou predominantemente a atividade real da economia, entretanto, as novas tendências focalizaram a necessidade de reduzir a intervenção e de liberalizar os mercados, com ênfase especial nas finanças internas, sustentando uma conta aberta de capital como meio de elevar a poupança nacional, aprofundar os mercados financeiros internos, reduzir os custos de intermediação financeira através do aprimoramento da concorrência, satisfazer a demanda individual de diversificação de riscos e otimizar a alocação de recursos.
                    Embora os partidários dessa abordagem estivessem de acordo com o diagnóstico estes se dividiam entre adotar simultaneamente em um tipo de big bang e outros de uma maneira seqüencial sendo a conta de capital aberta somente após a consolidação das outras medidas liberalizantes. No que diz respeito a essa divergência de opinião com respeito à velocidade da abertura da conta de capital, a abordagem gradualista é mais consistente com as conclusões derivadas do debate internacional sobre a seqüencialidade das reformas.
                        No grande aumento dos fluxos em 1991/1993 observa-se o caso do México como o mais dramático (de quase zero entre 1983/90) para 8% do PIB em 1991/93, na Argentina e o Chile o aumento foi substancial, mas menos dramático. Quanto às fontes desses ingressos para a América Latina vê-se que as carteiras de ações emergiram como uma fonte nova de financiamento, os lançamentos de títulos também aumentaram notoriamente de importância, enquanto que os empréstimos de bancos caíram substantivamente, tendência que seguem as tendências globais especialmente ao que se refere aos empréstimos dos bancos comerciais e a rápida ascensão dos valores mobiliários (títulos, ações).
                        No que se refere à composição regional dos fluxos de oferta observa-se os EUA como fonte importante, conseqüentemente pelas perspectivas de implantação do Nafta e de maior integração hemisférica. Entre 1987/90 25% do IED partiram da Europa e apenas 5% veio do Japão, sendo a maioria para paraísos fiscais. No que tange às similaridades entre estes vale ressaltar, de início, que todos os investidores institucionais, especialmente os fundos de pensão e as companhias de seguro, têm presenciado um aumento dramático de seus ativos totais na última década; uma segunda tendência foi a ocorrência de mudanças regulatórias que melhoraram o acesso dos países em desenvolvimento a seus mercados de ações e títulos; em relação às restrições está se deve ao fato que, embora conscientes de melhoras importantes nas economias latino-americanas e dos retornos mais altos, estes ainda percebem  estes países  como potencialmente voláteis tanto econômica quanto politicamente.
                        Um dos maiores problemas para os formuladores de políticas e órgãos reguladores é tomar decisões em meio a dados incompletos sobre a magnitude dos diferentes tipos de fluxos. Em que medida esses fluxos são canalizados para investimento, quão eficientes são esses investimentos e que proporção é canalizada para a produção de bens comercializáveis? Informações mais completas, consistentes e rápidas dos fluxos privados seriam benéficas para todos os participantes, nos países de origem dos recursos e nos destinatários, incluindo poupadores, investidores e tomadores. Além disso, os benefícios da interação do fluxo de capital privado com o desenvolvimento dependem parcialmente do acesso estável e previsível aos mercados financeiros. Os riscos de restrições abruptas na oferta e/ou aumentos rápidos e excessivos no custos e o encurtamento dos prazos de maturidade dos passivos externos são parcialmente determinados por percepções de risco e, portanto, pelas políticas do país recebedor dos recursos. Mas, do ponto de vista dos países em desenvolvimento, o acesso pode estar fortemente condicionado por dinâmicas do lado da oferta, determinadas exogenamente e relacionadas a políticas de países industrializados nas áreas de regulação macroeconômica e financeira.
                       A subida expansão dos ingressos de capitais forneceu financiamento necessário à continuação, de um modo socialmente mais eficiente, dos programas de ajuste estrutural iniciados por vários países na década de 1980. Porém, representaram também um desafio com relação à mecanismos de proteção à crises financeiras, estabilidade e sustentabilidade do equilíbrio macroeconômico e para promover investimento. Para a região como um todo houve efeitos positivos de tipo keynesiano. A disponibilidade de poupanças externas possibilitou o financiamento de mais importações associadas a um maior uso da capacidade produtiva, o que, por seu efeito na produção e na renda, reativou a demanda agregada (Chile, Argentina e Venezuela). A média anual chegou a US$ 62 bilhões em 1992/93. Essa tendência refletiu, inicialmente, na recuperação dos níveis “normais” de demanda agregada, de importações e da taxa de câmbio real, os quais se achavam condicionados pelas restrições externas durante o período anterior.
                        Ao se defrontar com uma abundância inesperada de financiamento externo, o qual podem ser parcialmente transitória ou com fluxo rápido demais para ser eficientemente absorvido pela economia, as autoridades podem: procurar moderar o impacto sobre a taxa de câmbio através da compra de divisas (acumulando reservas), podem adotar políticas de esterilização (operações de mercado aberto) para mitigar o impacto monetário do acúmulo de reservas decorrentes da invervenção em primeiro nível; e podem adotar políticas de incentivos, e sobretaxas ou controles quantitativos para regular os ingressos de capital, influenciando assim sua composição e volume. O objetivo é encorajar os fluxos  cujo volume seja consistente com a capacidade interna de absorção da economia, canalizando-os para projetos de investimento produtivos e, ao contrário, desencorajando a entrada de capital de curto prazo.
                        No caso de uma intervenção não-esterilizada, há a expectativa das taxas nacionais de juros e de inflação convergirem rapidamente para os níveis internacionais, visando estabilidade de preços, ancorando-se em uma taxa de câmbio nominal fixa, estando disposto a aceitar uma política monetária passiva. De fato, o BACEN deve acumular reservas internacionais substanciais à medida que compra divisas produzidas pelos ingressos de capitais. Sendo uma parte substancial do sucesso relacionado à confiança dos agentes econômicos na capacidade das autoridades monetárias de manterem a taxa nominal de câmbio, e da relação entre inflação e esta. Uma aposta exagerada nessa abordagem de ataque à inflação é claramente uma estratégia de alto risco.  
                        No caso de uma intervenção esterilizada há os efeitos monetários da acumulação de reservas durante a expansão dos ingressos de capital. O objetivo é isolar o estoque de moeda das grandes flutuações oriundas da mobilidade do capital estrangeiro. Se eficaz, esta intervenção evita que as taxas internas de juros caiam e limita a expansão da demanda agregada. Este tipo de intervenção foi preferida por países que deixaram para trás um conjuntura recessiva: manter uma política monetária ativa e, ao mesmo tempo, uma posição mais cautelosa com relação aos ingressos de capital. No entanto, esta esterilização não é livre de problemas. Os problemas surgem quando é pequena a flexibilidade do sistema fiscal para os governos poderem usar essa política para compensar os choques internos ou externos. O que acontece é que os outros instrumentos (monetário e cambial) são sobrecarregados. É por isso que, na prática, esta alternativa de intervenção tem sido combinada com outras medidas de políticas. Entre os países que optaram por uma intervenção ativa, o Chile é o que tem sido mais persistente, mas outros como a Colômbia, Costa Rica e México, também merecem ser mencionados.
                        Uma maneira de perceber que a economia segue para um patamar “economicamente saudável” seria separar os componentes permanentes dos temporários: se houver um fluxo permanente adicional e fenômenos a ele correlacionados como valorização do câmbio, crescimento do déficit da conta corrente e aumento do consumo, estes poderão ser considerados como ajustes estabilizadores. Se os fluxos forem temporários, esses movimentos mencionados nas variáveis-chave causarão distorções. A existência de externalidades e de outras imperfeições dos mercados internacionais de capitais dá origem a ciclos freqüentes de abundância e escassez de recursos e crises sistêmicas.
                        Os ingressos de capital, obviamente, não são sempre consistentes com os objetivos de estabilidade macroeconômica em seu sentido amplo, de crescimento sustentável e de justiça social; justifica-se, portanto, um certo grau de “gestão” governamental direta ou indireta, para influenciar o volume e a composição desses fluxos.
                        Os fluxos de capital são claramente um instrumento muito valioso para o desenvolvimento econômico e para o processo de integração da economia mundial. Porém, o caráter intertemporal das transações financeiras e a natureza incompleta dos instrumentos disponíveis contribuem para que os mercados financeiros  estejam entre os mais imperfeitos da economia. Portanto, melhores informações, regulamentação do setor financeiro e macrogestão (direta e indireta) ampla e prudente dos fluxos constituem um bem público em cujo gerenciamento há um papel a ser compartilhado pelos governos.

Leandro Moreira da Luz é aluno da disciplina Economia Brasileira no Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Maringá – período 2/2011.