sábado, 29 de dezembro de 2012

RESENHA DO ARTIGO: POLÍTICA ECONÔMICA, VULNERABILIDADE EXTERNA E CRESCIMENTO

PASTORE, A.C.; PINOTTI, M.C. Política econômica, vulnerabilidade externa e crescimento. In: VELLOSO, J.P.R (org.). O Brasil e o mundo no limiar do novo século – Vol. II. Rio de Janeiro: José Olympio, 1988.



O objetivo do trabalho foi analisar o regime cambial no Brasil, as críticas ao  do câmbio fixo, os custos da defesa de um ataque especulativo e a hipótese de uma maior flexibilidade cambial. Chegando ao entendimento que não há como baixar a taxa de juros se a política fiscal não se tornar mais contracionista, e sem baixar juros não há como alargar a banda de flutuação cambial, e conseqüentemente não há como sair do atual esquema de câmbio fixo. Neste regime teremos que conviver com o crescimento econômico baixo, para preservar o equilíbrio externo e a estabilidade de preços.


Mesmo com déficits públicos elevados é possível manter a estabilidade por um tempo longo, mas a custas de taxas reais de juros elevadas, o que restringe as opções de câmbio e limita o crescimento econômico, além de uma combinação com mobilidade de capitais que torna o país extremamente vulnerável a ataques especulativos e a fortes instabilidades macroeconômicas. 


A saída seria uma forte disciplina fiscal, com um regime de câmbio flexível. Sendo possível assim, reduzir as taxas de juros para produzir crescimento, preservando a estabilidade e utilizando as flutuações cambiais para evitar movimentos de capitais abruptos que geram flutuações cíclicas.


A política de câmbio adotada pelos países com inflação persistente deve-se a sua baixa credibilidade na adoção de outras políticas anteriores. Este regime torna a oferta de moeda endógena, o que faz com que a política monetária perca, no todo ou em parte, sua eficácia para alterar níveis de produção e emprego, na ausência de controle de movimentos de capitais estrangeiros, mas mantém para determinar o nível de reservas internacionais. A vantagem desse câmbio fixo reside na atuação da taxa cambial como âncora nominal, mas no médio prazo ela precisa ser suportada pela política fiscal adequada. Os defeitos são: 

a) a incapacidade de evitar que os países importem os ciclos econômicos que ocorrem nos demais países. Por exemplo: foi por estarem no câmbio fixo (no padrão ouro), que algumas economias européias importaram a depressão de 1929, iniciada nos Estados Unidos, e foi por estar com esse câmbio que o Chile sofreu uma recessão significativa nos anos 1980 quando os juros americanos foram elevados; 
b) a combinação deste com mobilidade internacional de capitais torna os países vulneráveis a ataques especulativos.

Compras contínuas em mercado aberto, ou financiamento contínuo dos déficits públicos com o imposto inflacionário, provocam quedas de reservas, convidando a um ataque especulativo, que sempre ocorre antes que as reservas se esgotem. Estes ataques também podem acontecer mesmo com “os fundamentos” fiscais em ordem: no México em 1994 porque o câmbio estava valorizado e a política monetária foi expansionista; na Tailândia diante da visão de que se o Banco Central elevasse a taxa de juros aprofundaria a crise bancária, gerando a expectativa de que preferiria desvalorizar; Na Inglaterra, em 1992, porque o país estava em recessão, e o dilema do governo consistia em defender a libra, o que requeria elevar a taxa de juros e aprofundar a recessão, ou desvalorizá-la, o que não provocaria o crescimento significativo da inflação, porque o país estava em recessão; 
c) deriva da tendência à apreciação provocada pelos fluxos de capitais. No câmbio fixo, conduz à apreciação do câmbio real porque valoriza o nominal porque a expansão monetária, devida ao acúmulo de reservas, na ausência de controles de movimentos de capitais, conduz ao crescimento dos preços relativos. O que pode conduzir a déficits não-sustentáveis nas contas correntes, indicando a necessidade de reajustes cambiais, na medida em que os especuladores tomem consciência de que, ou uma crise bancária potencial, ou uma recessão em grande profundidade, inibem as autoridades a elevar as taxas de juros.


Após aderir aos reajustes cambiais prefixados, em 1994-95, o incipiente influxo de capitais produziu a valorização do câmbio nominal e com ele do câmbio real. De março de 1995 em diante a política monetária foi utilizada para determinar as reservas internacionais, mas logrou alterar a atividade econômica. As reservas estáveis de maio de 1996 até as vésperas da crise indicam que se as taxas de juros fossem menores, esta teria declinado. E esta preservação do equilíbrio externo exigiu que a política monetária fosse contracionista, o que implicou sacrificar o crescimento econômico. Os déficits nas contas correntes crescem com a queda nos preços relativos (a valorização do câmbio real) e com a elevação da obsorção (gerada por políticas fiscais expansionistas) relativamente ao produto. Se não pode reduzi-los por alterações no câmbio real, terão que reduzi-los por contrações na absorção. Desse modo, é necessário manter as taxas de juros elevadas, o que reduz o crescimento econômico. Se a política fiscal fosse contracionista, liberando a política monetária para produzir a redução da taxa de juros doméstica sem elevar a absorção, os déficits em conta correntes não se elevariam, e colheríamos uma baixa taxa de investimentos e de crescimento econômico.


Taxas de juros elevadas fragilizam o sistema bancário, reduzem o crescimento, elevando o desemprego, aumentam os custos econômicos de manter o câmbio e preservar a estabilidade, além disso, não afasta os riscos de um ataque especulativo. Estes podem ter sucesso, ou não. Em 1994 o ataque ao peso mexicano foi bem sucedido, em 1995 na Argentina, preservou-se o regime cambial, ainda que à custa de uma forte recessão. Se o Brasil desvalorizasse o real na crise do Sudeste Asiático, derrubaria as moedas de outros países latino-americanas, comprometendo a confiança e trucando os movimentos de capitais. Esta estratégia aprofundaria, em vez de reduzir, os efeitos da crise. No entanto, o Brasil defendeu-se com a contração monetária, elevou a oferta de hedge (papéis cambiais) e as taxas de juros, estabelecendo o seu nível para cobrir dois riscos interligados: o “risco Brasil” (decorrente da incapacidade de servir as obrigações externas) e o risco de câmbio (decorrente da probabilidade de uma desvalorização, o que produz aumento na demanda por hedge). O que não exime o governo da negligência com a política fiscal, que impôs uma carga recessiva sobre a política monetária e elevou a recessão e o desemprego. 


Com o Treasury-bond cotado à 6% e um “risco Brasil” da ordem de 600 pontos base, o cupom líquido teria que produzir uma remuneração de no mínimo 12%. Se adicionarmos o IR e a desvalorização mensal anualizada (projetadas no mercado futuro de câmbio) implícita naquela medida de risco chegamos à 40% a.a., ou ainda mais. O que era, aproximadamente, o nível das taxas domésticas de juros que estancaria a fuga de capitais. Desse modo volta-se a acumular reservas. Entretanto com juros insustentáveis. Só podendo declinar se declinasse o “risco Brasil” ou a demanda por hedge cambial.


Quando todo este ciclo terminou, o espaço para redução da taxa de juros ficou pequeno, indicando que a defesa do real terá, ainda, o custo de manter a economia desaquecida. Nos últimos meses (1998) as taxas de desemprego se aproximam das verificadas na recessão 1981-83. Comparando a produção industrial dessazonalizada com o nível de emprego, até 1994 ambas caminham juntas, mas a partir desse ponto o emprego declina e a produção industrial se eleva, refletindo um ganho único de produtividade em parte pela liberação do comércio, pelas privatizações e pela estabilização dos preços.


Há a observação de que nas próximas décadas os arranjos de câmbios fixos estariam praticamente extintos, e as economias estariam reunidas em uniões monetárias, ou organizadas em esquemas puros de câmbio flutuante. No entanto, somente existe sentido uma união monetária se os países estivem contidos dentro de uma área ótima na qual existe elevada mobilidade de mão-de-obra. O Brasil é uma área monetária ótima, mas o MERCOSUL não é, pois não existe tal mobilidade. Se não existirem as variações cambiais que reduzem, ou eliminem, os efeitos do desemprego de um país sobre os demais, as flutuações cíclicas de uma país contaminarão os outros.  Para não “importar” este desemprego, teria que derrubar os salários, que, no entanto, são rígidos. 


A convergência para uma taxa de câmbio flexível não é simples, esta requer preparo para enfrentar o crescimento da volatilidade da taxa de câmbio. Modernamente os fluxos de capitais dominam os fluxos derivados da balança comercial. Esta preponderância faz com que taxa cambial seja formada no mercado de ativos. Os ativos internacionais são substitutos próximos dos domésticos e a decisão de alterar sua proporção na carteira depende das taxas de juros domésticas e internacionais, que são formadas observando as políticas monetárias, onde são formadas as taxas de juros, alterando a expectativa de desvalorização cambial.


Na crise de outubro 1997 existia um excesso de bens internacionais, porque existia déficit em conta corrente, e um virtual equilíbrio de oferta e demanda de bens domésticos, porque a taxa de variação dos seus preços era semelhante à dos bens internacionais. A demanda de bens internacionais cresce com a expansão fiscal e monetária como também a dos bens domésticos, a diferença é que o primeiro cresce com a valorização cambial e o segundo diminui. Desse modo, a desvalorização do câmbio nominal produziria mais inflação, e menores efeitos sobre o câmbio real. 


O crescimento econômico requer taxas de juros baixas, que podem ser praticadas mantendo a estabilidade dos preços com o câmbio real não valorizado e política fiscal não expansionista, caso contrário não será colhido déficits sustentáveis nem no orçamento fiscal, nem nas contas correntes.
                       
Leandro Moreira da Luz é aluno da disciplina Economia Brasileira no Programa de Pós-Graduação em Ciências Econômicas da Universidade Estadual de Maringá – período 2/2011.
           

           


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